Natural do Porto, nasceu no dia 7.6.1723, sendo filho de António Dias de Carvalho e de Maria Mayne, foi batizado poucos dias depois na Igreja de São Nicolau, tendo como padrinho o cónego magistral da catedral portuense, Manuel dos Reis Bernardes. Seguiu a vida religiosa, tendo ingressado na congregação da Terceira Ordem de Penitência, a 19.3.1742, professando no Convento de Lisboa.
Figura dedicada ao estudo, lecionou no seio da sua Ordem, tendo sido mestre de Sagrada Teologia. Em 1757, é dada à estampa a sua primeira obra sob o título
Grande parte da vida de José Mayne seria marcada pela sua atividade como censor, primeiro enquanto deputado da Real Mesa Censória e depois como deputado da Real Mesa da Comissão Geral para a Censura dos Livros, quando a primeira deu lugar a esta última por deliberação de D. Maria I, em 1787. A sua atividade como censor foi, naturalmente, enquadrada pelo zelo esperado dos censores régios que deviam impedir a disseminação de obras e ideias contrárias à ortodoxia católica e à Igreja, que conheceu no dinâmico período das Luzes a emergência e circulação de múltiplas correntes de pensamento contrárias e desafiadoras. Muitas dessas ideias e correntes de pensamento eram tidas pela coroa portuguesa como funestas, especialmente algumas das linhas tidas como mais “radicais” do Iluminismo. Graças ao parecer de Fr. José Mayne foram proibidas e censuradas as obras de autores como Robinet ou Helvetius, que propalavam o que chamava de “erros do materialismo” e a “perniciosa doutrina dos Novos Filósofos” (
Para além da atividade censória, Mayne foi ainda chamado a tomar responsabilidades significativas no seio da sua Ordem, tendo sido eleito, no dia 8.4.1780, ministro geral da Terceira Ordem de Penitência de São Francisco, tornando-se assim no superior da comunidade franciscana do Convento de Nossa Senhora de Jesus. Destaca-se o importante papel que teve na construção da Livraria do Convento, projeto dispendioso para a Congregação, para o qual constituiu um fundo de rendimento, construindo casas na cerca do convento cujas rendas contribuiriam para a conclusão da obra e para a compra de livros. Mayne contribuiu também, de forma significativa, com a doação de livros e de meios advindos de heranças familiares e dos rendimentos que recebia da coroa, para as obras da Livraria e para o seu incremento.
As suas decisões à frente do convento e da Livraria não foram, porém, desprovidas de discordâncias e tensões. Algumas dessas decisões foram, por exemplo, alvo de críticas por D. Fr. Manuel do Cenáculo, que era então bispo de Beja, mas que fora anteriormente superior dos franciscanos do convento e o responsável primeiro pela refundação da biblioteca das Mercês após o Terramoto de 1755, a que Mayne deu continuidade, apesar deste ter entrado em rutura com Cenáculo, de quem se veio a afastar após a morte do rei D. José I e o fim do consulado de Pombal, com o qual D. Fr. Manuel do Cenáculo ficou muito conotado, enquanto Mayne se destacava pela proximidade ao novo casal reinante.
É também de sublinhar que, a par das obras da Livraria, Mayne deu um impulso decisivo à constituição de um museu ou gabinete de história natural, aproveitando as já existentes coleções legadas por Cenáculo, as quais Mayne foi aumentando ao longo de vários anos através da aquisição continua de “instrumentos phisicos” e de “couzas raras, e de Historia natural” (
Os espécimes deste gabinete e os seus “instrumentos phisicos” adquiriram ainda grande protagonismo e tomaram um papel central na iniciativa de Mayne ao criar no convento de S. Francisco o que designou como “Escola Pública de História Natural Teológica”, que tomaria como material de apoio os objetos e espécimes do gabinete de história natural. Este desígnio de Mayne era motivado pelo desejo de ver ensinada a “Ciência da mesma História Natural com relação à Teologia, para que pelos Entes naturais se adquiram os conhecimentos dos Atributos divinos convencendo-se por este modo os Ateístas, Politeístas e mais Incrédulos” (
Segundo estipulado por Fr. José Mayne na carta de instituição desta aula ou curso, datada 21.6.1792, este devia funcionar três vezes por semana e contar com um corpo de professores, preferencialmente recrutados entre os religiosos do Convento de Nossa Senhora de Jesus que para isso fossem capazes, os quais ensinariam tomando partido dos espécimes, instrumentos, antiguidades e outros objetos que Mayne congregara no seu gabinete. Ficou ainda patente que esta devia ser uma “escola pública”, cujas aulas não se destinavam apenas aos religiosos do convento, mas a todos quantos desejassem tomar parte nas aulas. Mayne tomaria ainda outra decisão de grande relevância com vista a garantir a permanência e sustentabilidade do museu e da escola de História Natural Teológica ao determinar que a sua administração deveria ficar a cargo da Academia Real das Ciências de Lisboa, que teria de garantir a sua perpetuidade. Mayne reconheceu, pois, que era “impossível que todos os Padres Gerais tenham a necessária eficácia e propensão para perpetuar uma Ciência, cujo ensino não está em uso dentro dos claustros” (
As disposições relativas ao destino do museu e do curso foram submetidas à coroa e vieram apenas a ser confirmadas a 24.12.1792, no dia que se seguiu à morte de Mayne. Ainda assim, Fr. José Mayne viveria ainda quando do início do curso por si instituído. Relata a
Figura paradigmática do iluminismo católico português, a sua vida e ação é enquadrada pelo mesmo contexto que moldou outras figuras cimeiras da ilustração portuguesa, como Luís António Verney, Fr. Manuel do Cenáculo, ou Teodoro de Almeida. Fr. José Mayne demarcou-se pelo entusiasmo que nutria pela história natural e pelo importante contributo que legou às ciências através do museu e da aula que instituiu, que bem sinalizam a crescente importância que a história natural foi adquirindo ao longo do século XVIII. Personagem próxima do poder régio, zeloso defensor da ordem religiosa e política garantida pela proximidade entre o trono e o altar, grande parte do seu percurso e das decisões que tomou visavam o combate do que tomava como os “erros” que populavam o século e que acreditava poderem ter “horríveis e funestos efeitos”. Totalmente convencido da não existência de uma oposição entre a razão e a religião, mas antes uma complementaridade, bem como uma solidariedade entre ciência e religião, para Fr. José Mayne a ciência experimental coexistia e estimulava uma filosofia religiosa. Conforme bem deixou patente nas suas deliberações com vista à criação e destino do seu museu e aula, a coleção e o seu estudo tinham como objetivo último a contemplação da obra da criação e, por consequência, do Deus criador. Fr. José Mayne colocava-se, deste modo, na mesma linha de tantas outras figuras cristãs que marcaram o século das Luzes, podendo-se sublinhar neste caso a consonância do pensamento de Mayne com o de Domingos Vandelli, tendo este último afirmado numa sua
Fr. José Mayne faleceu no Convento de Nossa Senhora de Jesus, a 23.12.1792. Os