O ambiente familiar em que cresceu Rodrigo de Sousa Coutinho, filho primogénito de um primeiro casamento de D. Francisco Inocêncio de Sousa Coutinho com D. Ana Luisa da Silva Teixeira de Andrade, proporcionou uma educação desde cedo programada para o exercício de cargos públicos. O seu pai foi governador do Reino de Angola e embaixador em Madrid, conquistando lugar de destaque no círculo político de Sebastião José de Carvalho e Melo. Tal ligação explica que o padrinho de batismo do seu filho Rodrigo tenha sido o próprio Marquês de Pombal, o que pode ser visto como sinal anunciador de um destacado patrocínio e intencional envolvimento na formação de um potencial seguidor de idêntica carreira política. Após cursar o Colégio dos Nobres, instituição de criação pombalina, o jovem Rodrigo frequentou os três primeiros anos do renovado curso jurídico da Universidade de Coimbra imediatamente a seguir à reforma de 1772. Não chegou a concluir a sua formatura em leis, mas essa falha em nada perturbou o progresso dos seus estudos e a sua formação ilustrada. A morte de D. José, em 1777, e o consequente estado de desgraça em que caiu o seu protetor, não impediram que encetasse uma carreira pública como enviado extraordinário e ministro plenipotenciário na Corte da Sardenha. Tinha então 23 anos.
Instalado em Turim em setembro de 1779, aí permaneceu com curtas intermitências até meados de 1796. Foram 17 decisivos anos em que forjou e consolidou o seu pensamento ilustrado sobre diferentes matérias essenciais ao desempenho governativo. Entre os textos que então produziu sobre matérias europeias ou nacionais – muitos dos quais se mantiveram inéditos até finais do século XX – merecem destaque as descrições sobre a situação económica e social no Piemonte e Reino da Sardenha, e a avaliação sobre as possibilidades de extensão das relações de comércio entre Portugal e os estados de Itália.
Foi eleito sócio correspondente da Real Academia das Ciências de Lisboa em 22 de maio de 1780, passando ao estatuto de supranumerário cinco meses mais tarde, dada a circunstância da sua ausência prolongada como ministro plenipotenciário em Turim. Conhecia bem o ambiente das academias científicas europeias e mostrou-se disponível para colaborar com a Academia do seu país, como se comprova pela publicação no primeiro volume das
Neste “Discurso”, onde revela sua apetência pela discussão de temas económicos e financeiros, Sousa Coutinho procurou demonstrar a incorreção das teses que sustentavam que as minas de ouro e prata eram nefastas para o desenvolvimento das nações que as possuíam. Admitiu que a existência das minas e, consequentemente, o acesso às mercadorias que exerciam as funções de numerário, poderiam condicionar negativamente a criação da verdadeira riqueza. Todavia, não seriam esses os fatores responsáveis pelo estado de ruína ou decadência de um reino, obrigado a saldar com ouro e prata o deficit da sua balança de comércio. Para Sousa Coutinho, tal deficit era reflexo de deficiências estruturais que a existência de minas apenas ajudava a superar. Neste sentido, os seus argumentos desenvolveram-se por duas vias fundamentais: por um lado, através da explicação das razões históricas que haviam ditado, para Portugal, dificuldades de organização das estruturas produtivas e comerciais; por outro lado, mediante a explicação bem fundamentada sobre as potenciais vantagens da existência de minas, designadamente no que se refere ao acréscimo da oferta de moeda e consequente diminuição do preço do dinheiro ou juro. Assim se iniciava na escrita económica aquele que foi um dos primeiros leitores portugueses da
D. Rodrigo de Sousa Coutinho abandonou Turim em 1796 para ocupar em Lisboa o cargo de ministro e secretário de Estado da Marinha e Domínios Ultramarinos. As suas funções governativas ultrapassavam em larga medida o âmbito do pelouro ministerial que lhe fora atribuído. E cedo conquistou um lugar preponderante no gabinete do Príncipe Regente D. João. Um dos assuntos que mais o absorveu foi a resolução da difícil conjuntura financeira em que o país se encontrava nesse ano de 1796. Do lado das receitas, assistia-se ao efeito acumulado da morosidade crónica na cobrança de contribuições e impostos, assim como a alguma quebra nas receitas alfandegárias; do lado das despesas, por seu turno, registava-se um acréscimo significativo dos gastos decorrentes da participação nas campanhas militares dos Pirenéus, quando Portugal ainda alinhava ao lado da Espanha numa estratégia defensiva contra as pretensões expansionistas francesas. A criação de dívida pública através de um empréstimo interno mereceu a sua cuidadosa atenção, dada a necessidade de cuidar da sua amortização futura e do pagamento de juros aos credores particulares.
Nos planos, projetos e reflexões que produziu sobre estes assuntos revelavam-se os atributos de um estadista interveniente, mas também as qualidades de um leitor de obras de economia política (que a sua rica biblioteca exibia), nas quais colhia inspiração para o desenho e execução de políticas económicas. A insistência com que veio a terreiro sobre matérias de índole financeira demonstrava a sua capacidade para o exercício da função de presidente do Real Erário, o que veio a ocorrer entre 1801 e 1803. Este foi um período em que a sua estatura política se impôs, e não apenas no plano da sua reorganização fiscal e da previsão orçamental que eram os assuntos mais diretamente relacionados com as suas novas funções. Com efeito, em diversos textos e intervenções públicas, designadamente nos discursos anuais que pronunciou na Sociedade Marítima, Militar e Geográfica, D. Rodrigo deixou bem vincada a sua orientação em diversos domínios da ação governativa e delineou com rigor um conjunto de reformas económicas que premeditavam um desenvolvimento económico do sector agrícola, tendo por base a utilização mais intensiva de capitais e a diminuição de entraves administrativos e políticos à extensão do mercado interno.
Foi também neste período que impulsionou a criação da Casa Literária do Arco do Cego, uma tipografia cujo catálogo de obras impressas revelou uma preocupação central de divulgação de conhecimentos úteis e de ciência aplicada ao desenvolvimento agrícola e manufatureiro, sobretudo destinadas a um auditório brasileiro. O responsável pela tipografia, Frei José Mariano da Conceição Velozo, rodeou-se de um grupo de tradutores e gravadores predominantemente brasileiros, com o suporte institucional, financeiro e político de D. Rodrigo. O objetivo fundamental era capacitar o território brasileiro para o aproveitamento e desenvolvimento dos seus recursos naturais, numa perspetiva mais ampla de transformação da atitude extrativa da administração portuguesa em relação ao Brasil. O empenho direto do presidente do Real Erário neste projeto editorial de difusão de saberes práticos era também um sinal da importância que atribuía às redes de sociabilidade científica que lhe forneciam argumentos de autoridade para a concretização do seu projeto político. Deste modo, Sousa Coutinho revela vontade expressa em criar circuitos de produção e divulgação de conhecimento científico que ultrapassavam o âmbito institucional da Academia das Ciências de Lisboa. Apesar de ter sido feito sócio honorário da Academia em 1797 (um ano após o seu regresso de Turim), nunca manteve atividade académica regular. Porém, não deixou de mostrar alguma disponibilidade de colaboração institucional, conforme se comprova na consulta do seu processo académico pela correspondência com o presidente e secretário da Academia, remetendo publicações de naturalistas ou aprovando a publicação das
O interesse em explorar vias autónomas de gestão e comunicação de matérias de âmbito científico – fosse nas atividades regulares da Sociedade Marítima, Militar e Geográfica, ou na produção tipográfica da Casa Literária do Arco do Cego – demonstra bem a determinação de D. Rodrigo de Sousa Coutinho em criar suportes institucionais que apenas dependessem da sua decisão política. Sem nunca ter hostilizado a Academia das Ciências, não há dúvida que sempre preferiu não ficar subordinado aos ditames de um poder científico que não era por si controlado, procurando garantir soluções institucionais alternativas de validação dos saberes produzidos por encomenda. Para se compreender esta atitude é fundamental ter presente a correspondência regular que manteve com José Correia da Serra, entre 1798 e 1800, quando este se mantinha no seu exílio londrino, na qual transparece uma superior motivação em se manter atualizado sobre novidades e descobertas no mundo da ciência, tão agitado como o mundo dos negócios políticos e diplomáticos. Um dos seus mais respeitados informadores científicos era, afinal, um dos fundadores da Academia que, entretanto, seguia outros caminhos científicos fora do país.
D. Rodrigo de Sousa Coutinho demitiu-se das funções governativas em 1803 e só viria a ganhar novo protagonismo político com a deslocação da corte do Príncipe Regente D. João para o Brasil no final do ano de 1807, perante a iminente invasão do território português pelas tropas napoleónicas. Viria a morrer no Rio de Janeiro em janeiro de 1812, entretanto agraciado com o título de conde Linhares.