Dicionário Histórico-Biográfico da Academia das Ciências de Lisboa

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SanchesAntónio Nunes RibeiroPenamacorParisMédico e polímata. Sócio correspondente.António Nunes Ribeiro Sanches.jpgAntónio Nunes Ribeiro Sanches – gravura de G. Levillain, segundo desenho de Moitte, 1785, in "Observations sur les maladies vénériennes", Paris, 1786)Ass-Antonio-Ribeiro-Sanches.png

Filho de Simão Nunes, negociante, e de Ana Nunes Ribeiro, ambos cristãos-novos. Aos treze anos foi estudar para a Guarda começando desde cedo a revelar as suas aptidões intelectuais. Aí conviveu com Martinho de Mendonça de Pina e Proença (1693-1743) bibliotecário real, homem culto e viajado, que muito o influenciou. Prosseguiu estudos jurídicos e médicos na Universidade de Coimbra, mas desistiu ao fim de algum tempo desagradado com o ensino e o ambiente académicos. Mudou-se então para Salamanca onde se licenciou em Medicina (1724). Depois de um curto exercício profissional no nosso país, com receio das perseguições da Inquisição, seguiu para Londres, daí iniciando um périplo internacional para aprofundar os seus conhecimentos médicos. É neste contexto que se torna discípulo de Herman Boerhaave (1668-1738) na Universidade de Leida.

Ribeiro Sanches começou o seu exercício profissional como médico em Benavente durante dois anos. Até 1731 clinicou pontualmente no estrangeiro, mas nesse ano, e por recomendação de Boerhaave, foi contratado como médico da cidade de Moscovo. Na Rússia ocupou diversas posições importantes até 1747: médico da corte em Sampetersburgo, médico do exército imperial, médico pessoal da czarina Ana Ivanovna, membro honorário da Academia Imperial de Ciências (1739) e conselheiro de Estado.

Incomodado com intrigas palacianas a seu respeito decidiu deixar o país e fixar-se em Paris. Aí desenvolveu até ao fim da vida notável atividade científica manifestando sempre um grande amor a Portugal. Foi um estrangeirado que ao país jamais mais voltou.

Da sua intensa atividade em França destacam-se o exercício clínico, com particular atenção à saúde dos compatriotas, dos russos e dos pobres, a par do envolvimento nos mais elevados meios científicos, como o atestam a correspondência trocada com insignes personalidades, a nomeação para a Academia das Ciências de Paris (1747) e a colaboração nas enciclopédias de d’Alembert, Diderot e Panckoucke, na história natural de Buffon e nas memórias de diversas academias. Neste período escreveu várias obras de referência no âmbito da Medicina sobre doenças venéreas, higiene e saúde pública, e o ensino da Medicina. Publicou também outros trabalhos em português, francês e latim, de caracter pedagógico, literário e político. Para além disso, a sua preocupação com o desenvolvimento de Portugal e da Rússia levou-o a elaborar diversos pareceres sugerindo importantes reformas no âmbito da educação, universidade, comércio, agricultura, colónias, monopólios, etc., correspondendo muitas vezes a solicitações dos Governos.

A vasta obra que nos deixou compõe-se de trabalhos que foram impressos em vida e de muitos manuscritos que vieram a ser dispersos por várias bibliotecas nacionais europeias. Os múltiplos domínios que abordou e toda a sua intervenção revelam-no como um sábio multifacetado e vanguardista que atingiu uma grande projeção internacional. Contudo, o reconhecimento desse valor em Portugal foi tardio e a primeira referência detalhada às suas obras surge apenas em 1759 na Bibliotheca Lusitana (t. IV) de Diogo Barbosa Machado, quando já contava 60 anos.

Em 22 de Maio de 1780 Ribeiro Sanches foi eleito académico correspondente da recém-fundada Academia Real das Ciências de Lisboa associando todo o seu prestígio à novel instituição. Faleceu três anos depois, não havendo registo da sua participação na vida académica. Contudo, a sua notável figura foi desde então diversas vezes evocada, nomeadamente, a propósito da descoberta de documentos de interesse biográfico, como o atestam as comunicações dos académicos Maximiano Lemos (1910), António Ferrão (1936) e Almeida Lima (1950). O primeiro destes foi mesmo o seu mais destacado biógrafo.

Origem da denominação de cristão velho e cristão novo no reino de Portugal, manuscrito, Arquivo Distrital de Braga, PT/UM-ADB/PSS/AANRS/000001, 1731-1735; Dissertation sur l’origine de la maladie vénérienne, Paris, Durant et Pissot, 1750; Tratado da conservação da saúde dos povos, Paris e Lisboa na casa de Bonardel e Du Beux, 1756; Cartas sobre a educação da mocidade, Colónia, 1760; Método para aprender e estudar a medicina, Paris,1763; “Maladie vénérienne chronique”, in Encyclopédie ou Dictionnaire raisonné des sciences, des arts et des métiers, ed. Diderot e D’Alembert, vol. XVI: 83–84, Neuchatêl, Samuel Faulche, 1771; Dificuldades que tem um reino velho para emendar-se [1777], manuscrito transcrito em Vitor de Sá (Sel., apresent. e notas), Francisco Ribeiro Sanches. Dificuldades que tem um reino velho para emendar-se e outros textos, Porto, Editorial Inova, 1971;Observations sur les maladies vénériennes, ed. Charles Andry. Paris: Théophile Barrois le Jeune, 1785, Paris, 1785; “Affections de l’âme”, in Encyclopedie methodique — médecine, par une société de médecins, vol. I A-ALI: 247–277, Paris, Panckoucke, 1787. Processo académico, AH-ACL, PT/ACL/ACL/C/001/1780-05-22/ANRS; Lemos, Maximiano, Ribeiro Sanches, a sua vida e a sua obra, Porto, Ed. Eduardo Tavares Martins, 1911;Lemos, Maximiano, História da Medicina em Portugal. Doutrinas e instituições, Lisboa, Publicações Dom Quixote/Ordem dos Médicos, 1991; Mira, M. Ferreira de, História da Medicina Portuguesa, Lisboa Empresa Nacional de Publicidade, 1947; Namora, Fernando, Deuses e Demónios da Medicina, Lisboa, Publicações Europa-América, 1973; Sá, Vítor de, Ribeiro Sanches. Dificuldades que tem um reino velho para emendar-se e outros textos, Lisboa, Editorial Inova Lda., s. d.; Willemse, David, António Ribeiro Sanches, élève de Boerhaave, et son importance pour la Russie, Leiden, 1966; Ferrão, António, “Ribeiro Sanches e Soares de Barros. Novos elementos para as biografias desses académicos”, Boletim da 2ª Classe ACL, Vol. XX, Lisboa, 1933, pp. 5-99; Lemos, Maximiano, “Portugueses ilustres em França: Soares de Barros, João Jacinto de Magalhães e Ribeiro Sanches”, Boletim da 2ª Classe ARCL, Vol. III, Lisboa, 1910, pp. 431-463; Lima, Almeida, “Uma carta inédita de Ribeiro Sanches”, Boletim da ACL, nova série, Vol. XXII, Lisboa 1950, págs. 125-134.José Pereira MiguelPortuguesaSócio correspondente